segunda-feira, 26 de julho de 2010

PIRATAS DA SAVANA "CHAFÚRDAM NA LAMA"


Não quero, de modo algum, que interpretem literalmente o título deste post e portanto farei de tudo para vos elucidar correctamente mas se mesmo assim não for eficaz, não vos condeno. Desde o "último café" muita coisa se passou...

No fim de semana passado viajamos para Inhambane, que se situa na costa de Moçambique, para norte. Sexta, fomos á "junta" apanhar o machibombo e partimos numa aventura de 8 horas. Nesta viagem fui acompanhada por uma "mamã" que ora vomitava bílis ora bebia gin, ora vomitava na capulana, ora vomitava na minha mochila. Bem eu não sabia se me ria ou se vomitava também. Mas mais uma vez valeu a pena o sacrifício pois sem tudo isto não teria a oportunidade de ver talvez a paisagem mais bonita que alguma vez sonhara haver. Um extenso palmar (dizem que o maior do mundo), no meio da floresta por caminhos de terra/areia vermelha batida ou por alcatrão, entre povoações e palhotas.

Nas paragens éramos interceptados por vendedores incansáveis que traziam frutas, castanha(caju) ou amendoim, gulodices e fritos, refrescos entre outras coisas vendáveis e lá seguíamos viagem novamente entre uma vegetação extremamente rica e exótica á nossa esquerda e/ou lagoa(Quissico ou Inharime) bem como o meu querido Índico á nossa direita. Definitivamente de cortar a respiração. Assim chegamos a Inhambane, uma cidade piscatória ainda com claras reminiscências do período colonial, verdadeiramente bonita e aí apanhamos um chapa para o Tofo que se situa a 30 minutos dali. Um sítio absolutamente paradisíaco. Um extenso areal por onde entra o famoso Índico no qual pela primeira vez me banhei ainda que não completamente. Aqui ficamos de sexta para sábado, dois dias maravilhosos, com direito a um jantar delicioso no mercado, marisco, passeio, muita risota, alegria, boa gente e boas conversas e um céu inacreditável. Sábado apanhamos, por volta das 4 da manhã, o machibombo de volta para Maputo, uma odisseia ligeiramente perigosa visto o condutor ser um pouco "racer". E assim por volta do meio dia estávamos de volta á civilização. Nesse mesmo dia voltamos para as Mahotas.

A semana correu na "paz do senhor", muito trabalho juntamente com muita felicidade e aprendizagem e mais algum ranho e lesões.

Nesta sexta, dia de casa da alegria, houve alegria...O João, o rapaz que nos leva do centro de saúde Polana Caniço, onde trabalha a irmã Raquel, para a casa das irmãs de Calcutá fazia anos e portanto houve direito a festa e presentes, música e dança e sobretudo muita simplicidade e amor por parte de quem tudo isto recebeu. Mais o facto de estarmos com o Daniel, um rapaz de 34 anos com "sida até aos cabelos", mas que tem um apetite bem aguçado e que só fala em comida e se lhe podemos trazer uma "arrufadinha com queijinho", um "bolinho de arroz ou uma natinha" ou mesmo "um cachorrinho". Uma delícia este indivíduo. Seguidamente, uma viagem num chapa de caixa aberta de Ulene até á cidade, onde chegamos e procuramos um sítio para dormir. Mas, azar dos azares, estava tudo que era acessível em Maputo relativamente a dormidas, absolutamente cheio e restava-nos apenas a "Pensão Central", que de nome só se aplicava o central pois o que nos restava não era nem uma camarata nem um quarto, seria simpaticamente, dois sofás carregados de ácaros e outros seres talvez nunca identificados. Portanto, depois da vinda de uma noite, paz e eu, sacamos das nossas capulanas e de sapatilhas e tudo deitamo-nos naquele amontoado de vida e ali ficamos até acharmos que seria altura de irmos embora. Tivemos direito a ouvir aquilo que seriam rituais de uma seita não identificada, gente estranha que nos olhava com desdém, e o "chefe" que nos pergunta se vamos continuar por ali ao qual respondemos de forma simples e objectiva "não se preocupe daqui a pouco(5 horas) voltaremos para as Mahotas". Enfim, resultado? Rir até fazer chichi nas calças.

Sábado voltamos para as Mahotas pois domingo seria a ida á Feira Popular com os miúdos, com os quais, juntamente com a mana Angela, estamos a trabalhar. Tivemos direito a brinde, uma missa do novo pároco da comunidade que tardou em chegar. O pároco e a missa. A espera foi de três horas e só chegou mesmo a missa e o bispo, do pároco nada. O público que inicialmente estava bastante ansioso depois demonstrou-se desiludido. Pudera. Mas entretanto já se sabe quem é, o padre Dionísio, diria a irmã Goretti, deus do vinho.

Domingo foi a tão esperada ida á feira popular, uma verdadeira loucura. Desde a felicidade dalguns miúdos conhecerem a cidade pela primeira vez, e note-se que as Mahotas fica a 15 km de Maputo, desde a viagem num chapa com 20 lugares para 37 miúdos, os carrinhos de choque, os aviões telecomando, o concurso de dança, o almoço, as músicas, os cantos, a alegria constante, a surrealidade da feira popular e sobretudo aquilo que mais me impressionou foi a simplicidade com o que faz sentir felizes, estas crianças. Supostamente tão pouco para nós e para eles "é o mundo". Gostei mesmo muito deste dia, fez me lembrar de quando era criança e do quanto insuportável era, e que por vezes ainda o sou.

Bem o coração já vai estando bastante apertado, é quase "hora" de ir embora...mas isso serão "outros quantos", outro post, outra história.

Um grande beijinho com saudades

Mána Téresinha

quarta-feira, 14 de julho de 2010












Piratas da savana.


O cenário envolvente que premeia muito pelos contrastes, mantêm-se. Apenas torna-se urgente que a postura seja diferente. Através do sentido de humor e da loucura, as coisas, tomam uma proporção e forma destinta, o que de alguma forma facilita a assimilação de toda esta experiência e das emoções inerentes.

Sexta-feira é dia de "Casa da Alegria" e como já vos referi, de alegria tem muito pouco. As irmãs de Calcutá estão onde mais ninguém quer estar e percebe-se perfeitamente o porquê. Basicamente o campo envolvente é uma grande lixeira que a nível de dimensões assemelha-se a uma cidade e onde lá, por incrível que pareça, sobrevivem pessoas. Este projecto centra-se especificamente nos indivíduos que foram esquecidos pelo mundo e recordados pela insaciável morte. Os moribundos, os intocáveis, os abandonados, a quem lhes é dada uma oportunidade de viver ou de morrer dignamente. É por aquele local de passagem, que passam pequenos grandes novos velhos homens mulheres, normalmente com SIDA e condenados com "o morrer hoje ou amanhã". Não existem cursos ou manuais de instrução que nos ajudem a entender e a lidar com situações como estas, nem o século XXI o consegue explicar, nem eu, pessoalmente sou capaz de o fazer. Resta-nos apenas dar uso aos nossos órgãos e membros, aos nossos braços, mãos, olhos, ouvidos e sobretudo ao nosso coração que é o meio, o termo, a razão pela qual vale a pena viver.


Neste fim de semana, sábado, embarcamos para a "Ponta do Ouro", a 4 horas de Maputo. As 9h estávamos apanhar o barco para Katembe onde seguidamente iríamos apanhar o que nós suponhamos ser um 4x4, mas mais uma vez engano nosso, iríamos no nosso tão querido e já outrora referido chapa. Á partida pareceu-nos um pouco suspeito, mais adiante, comprovamos que valeu todo o sacrifício que vos passo a descrever: neste transporte só podem estar por volta de 12 pessoas mas normalmente estão mais de 20. Conseguem imaginar, algum calor, 2 "molungas" no meio de moçambicanos, todos enlatados, apertados, com tubos de metal nos pés, malas que se multiplicam, pernas que estão constantemente a bater nos ferros do banco da frente, tudo isto, através de caminhos sinuosos e bastante acidentados em que se partilha qualquer coisinha de suspensões e amortecedores. Resultado: ora cabeça no tecto, ora cabeça na frente, ora cabeça atrás, ora negras nas pernas, ora chiclete nas calças, só para o lado é que não se anda pois vamos bem amortecidos pelo excesso de pessoas. Bem, mas sem tudo isto não haveria uma viagem incrível pelo meio da savana, entre muitos risos e paisagens, cheiros e cores, serenidade e loucura, uma viagem pelo verdadeiro Moçambique que ainda não havia conhecido. Inesquecível. E tudo isto culminou com a chegada...uma praia que se situa numa espécie de aldeia ligeiramente selvagem e na fronteira com a África do Sul por quem é claramente explorada. Aqui não existe mais que um mercado, um complexo de aldeamentos e uns poucos cafés/restaurantes por sinal caros. Soube-me muito bem sair deste Maputo já demasiado ocidentalizado e conhecer um pouco mais deste país inacreditável carregado de cenários contrastantes.

Aqui vos deixo um pouco mais desta aventura, que todos os dias confirma a minha alegria por ter vindo, mesmo que seja por pouco tempo e mesmo que muitas vezes tenha de recorrer ao mencionado sentido de humor para que me seja possível entender determinadas situações inimagináveis.

Um grande beijinho com muitas saudades

Mána Téresinha

segunda-feira, 5 de julho de 2010

"SÓ RIRrrr..."

Este é o abençoado lema usado constantemente pela paz e por mim que trespassamos á clara, e de facto é "remédio santo". Só rir!
Acabadas de sair dum episódio surreal digno de jornal "o crime", que transparece na perfeição este lema. Passo-vos a contar...Ora bem, depois de um jantar delicioso(lentilhas, arroz com côco com direito a carapau na "palhota" das manas Sakina e Anastacia viemos para a nossa "palhota" que mais tarde, revelou ser uma fortaleza. Passado algum tempo, começámos a ouvir uns barulhos deveras estranhos, que se assemelhavam a uma tentativa de quem tenta forçosamente entrar na casa de alguém sem ser convidado. Como imaginam, começamos a ficar um pouco atordoadas para não dizer "cócó nas calças" tendo em conta que ultimamente têm havido imensos assaltos e outras tantas situações pouco recomendáveis... E os ruídos permaneciam. Como nos foi informado pelas irmãs sempre que estivermos em apuros, pegamos no nosso apito cedido pela irmandade e damo-lo uso. Portanto, podem imaginar paz e eu, cada uma com o seu pertencente apito, riamo-nos com o coração nas mãos....e o barulho lá "ganhava voz" para acentuar o nosso pânico...!Ligamos ás irmãs que vieram em nosso auxílio com os apetrechos necessários,mais 2 manas e o "pápá" o nosso vigilante das noites, e depararam-se com o seguinte cenário:
UM CÃO QUE FIELMENTE GUARDAVA, Á PORTA, A NOSSA FORTALEZA, e que simplesmente queria a nossa atenção(pelo menos preferimos pensar assim). Bem, resumindo e concluindo, somos motivo de chacota nos próximos tempos e tema de conversa aquando o "mata-bicho"(pequeno-almoço) de amanhã.
Bem, deixo-vos, com este "circ du soleil" e uma boa noite!!!
Um grande beijinho e uma saudação canina para este tão zeloso cão.
Mána Téresinha

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Ora bom dia, boa tarde, boa noite senhor inverno...
Da janela do meu quarto o cenário é de chuva torrencial, frio e um vendaval tremendo, já começa anoitecer(16:30)... não me posso lamentar, esta estação tem sido bem simpática,os dias de sol e a temperatura amena, têm sido constantes. Nada comparado com o nosso forte e desagradável inverno.
Já aqui estou quase á um mês, como o tempo passa, e no entanto parece que já cá estou á muito mais tempo. Não só pela intensidade dos dias mas pelo que já carrego comigo, uma verdadeira fortuna. Eu já suspeitava que iria aprender muito, simplesmente, nunca imaginei que essa aprendizagem fosse tão generosa e cheia de iniciativa e se apesar de todos estes ensinamentos me fazerem sentir muito pequena, ao mesmo tempo me demonstram que tenho eternamente oportunidade de crescer. Confesso que isso me dá uma enorme alegria.
Um grande beijinho,
Teresinha